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Editora na novela: Mário ( Lucio Mauro Filho ), Sofia ( Valentina Vieira ), Vera ( Angela Vieira ), Alberto ( Antonio Fagundes ), Nana ( Fabiula Nascimento ) e Marcos ( Romulo Estrela ) ali. Foto: TVGlobo/João Cotta |
“Bom Sucesso”, a novela da TV Globo assinada por
Paulo Halm e Rosane Svartman e que chegou ao fim nesta sexta-feira, 24 de
janeiro (com reprise no sábado, 25, com promessa de cenas inéditas), honrou o
próprio título, uma referência ao bairro de periferia do Rio de Janeiro. A produção foi coroada com uma
rara trajetória de aceitação tanto pela audiência quanto pela crítica.
Melhor, foi uma história que ao longo de
seus 155 capítulos apresentou trechos de obras-primas da literatura brasileira e universal, indo de Machado
de Assis a Jorge Amado, passando por Vinícius e Moraes, José de Alencar, Jorge
Luís Borges, Emily Bronté, entre tantos outros. Títulos como "Alice no País das Maravilhas", "Peter Pan", "Cyrano de Bergerac" e mais algumas dezenas deoutros foram lidos e citados ao longo dos episódios,
sempre de forma sutil e delicada, na maioria das vezes em leituras feitas pelo personagem Alberto
(Antônio Fagundes) ou com encenação de passagens na imaginação de Paloma (Grazi
Massafera).
Com um patamar de audiência sempre
próximo aos 30 pontos de média (cada ponto na Grande São Paulo corresponde a cerca
de 75 mil domicílios com TV), um feito e tanto em tempos de concorrência com a audiência das plataformas de streaming,
a história foi capaz de agradar também aos críticos da área. O que se viu foi um texto inteligente, caprichado e bem dirigido, com diálogos pontuados pelo fino da boa literatura
e com atuação de um elenco em sintonia, afinado, com muita química entre si.
Antônio Fagundes e Grazi Massafera são
os principais nomes deste sucesso. O ator conduziu com a competência de sempre
o seu Alberto, que poderia ter sido mais um idoso enfermo ranzinza, mas que
brilhou em todas as aparições, ainda que sempre sentado numa cadeira de rodas. Nos
penúltimo capítulo, o personagem viveu seu momento sublime, ao desfilar pelo
sambódromo carioca com um semblante de encantamento ao lado de sua musa.
A alguém que nunca acompanhou a novela,
bastaria esta cena para entender todo o universo do personagem. Fagundes, com o dom que só os grandes atores
desfrutam, antes de viver a rotina de gravações de mais de uma centena de
capítulos, já tinha definido a alma que iria dar ao seu Alberto. Estava tudo
ali, como ele iria incorporar o personagem, e o que fez é o mais declarado
exemplo do trabalho de interpretação: o gestual, a fala, a expressão facial e o
tom de voz seriam as marcas que ele cravou para ser o protagonista mais
interessante da trama.
A sequência foi gravada no Carnaval de
2019, portanto antes do início das gravações da novela, que só estreou em julho
do mesmo ano, e mostra toda a entrega do ator ao seu personagem. Grazi Massafera ainda não estava neste momento tão envolvida em sua
Paloma, mas a atriz também é dotada daquela característica que não é
distribuída a torto e adireito, e soube rapidamente desenhar seu papel da suburbana e mãe
solteira de três filhos tendo por molde todo seu inegável carisma.
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Rômulo Estrela e Grazi Massafera TV Globo/Gshow |
Paloma foi uma gata borralheira dos
tempos modernos, de vida difícil, que por uma lance do destino acabou envolvida
num conto de fadas e depois de muitas idas e vindas acabou ao lado do seu
príncipe. Bonita e de sorriso largo, a atriz cativou no papel da costureira pobre
que descobre o maravilhoso mundo dos livros por meio de seu patrão e protetor
Alberto.
A amizade e cumplicidade entre
os dois foi o fio condutor da narrativa e deu palco para as leituras
dramatizadas. Em algum momento o enredo chegou a sugerir o nascimento de uma
paixão românica no casal – eu mesma teria preferido esse caminho -, o que
aparentemente foi descartado para o bem de uma admiração apenas platônica por
ambos. Tanto que Alberto até ganhou uma namorada, que entrou na segunda metade
da novela – vivida por Ângela Vieira.
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Deborah Secco (em participação especial) e Ingrid Guimarães no último capítulo TV Globo/GShow |
O núcleo de Paloma e sua família era um
tanto realista, onde tudo sugeria que Bom Sucesso poderia até não ser ficção. A
mocinha tinha filhos de pais diferentes e de cores diferentes e o fato de haver
também outros casais inter-raciais na história dotou a produção de uma
diversidade que não deveria ser abandonada daqui por diante.
Neste módulo da periferia, centrado na
figura da costureira e seus filhos, um pouco do modo de vida caraterístico foi inserido de forma natural na trama. Personagens adjacentes se apresentavam numa mistura
de culturas, em que samba, rap, igreja e escola mostravam seu papel e
influência nos subúrbio. Havia a criminalidade, mas também uma força criativa
latente, com os talentos para o esporte (grande destaque para o basquete
praticado em quadras de rua) e também para a literatura pululando mesmo naquele
ambiente.
O núcleo de Alberto era o clichê que não
pode faltar nas telenovelas: família rica em mansão, donos de uma grande
editora, filho mulherengo, filha casada com um cafajeste. Vale ressaltar o antagonista,
muito bem incorporado por Armando Babaioff; e a Nana vivida com tanto afinco por
Fabiúla Nascimento, um personagem
secundário que ela fez com gigantismo de protagonista.
Os dois grandes amores de Paloma, os galãs
Rômulo Estrela e David Júnior, também deram o tom romântico necessário. Os
jovens e crianças de ambos os núcleos deram
a leveza e ritmo necessários a uma trama das sete da noite. Vale anotar os
nomes desta nova geração, como Bruna Inocencio (Alice), Giovanna Coimbra
(Gabriela) e João Bravo (Peter), que brilharam como filhos de Paloma, além da doçura
que é Valentina Vieira (Sofia).
Até alguns deslizes, como a presença um
tanto exagerada e caricata da personagem Suzana Nolasco, de Ingrid Guimarães, e
uma sequência de vilanias e maldades até desnecessárias – como o ressurgimento do criminoso ex- de
Paloma - na reta final da história felizmente não chegaram a comprometer o
todo.
Merecidamente, e tendo atravessado alguns
dos seus principais acontecimentos em meio aos feriados de final de ano, “Bom
Sucesso” atraiu atenções até o seu epílogo. Foi eleita pela APCA – Associação Paulista
de Críticos de Arte como a melhor novela de 2019. E vai deixar saudades no
horário das 19h.
A Globo disponibilizou este especial
sobre os bastidores do capítulo final. Para fãs, vale muito. Aqui .
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